Por Sergio Vidal para o Ganja Talks,
Quando estamos falando da cannabis do ponto de vista dos efeitos medicinais, ou mesmo apenas dos psicoativos, precisamos compreender que não existe uma resposta simples, pois existem diferentes fatores que influenciam em como serão esses efeitos. Tipo de planta, técnicas de cultivo, métodos de extração e consumo, todos esses são apenas alguns dos fatores que podem interferir na forma como a cannabis atua no organismo. No caso específico dos efeitos psicoativos existem ainda fatores que são externos às questões farmacológicas e dizem respeito à psiquê do indivíduo, suas condições sociais, dentre outros fatores. Nesse texto vamos falar a respeito dos principais fatores que influenciam nos efeitos psicoativos da cannabis.
Os fitocannabinóides e seus efeitos
Atualmente são mais de 100 fitocannabinóides conhecidos pela ciência, dos quais mais de 9 têm comprovada ação medicinal. Os fitocannabinóides são moléculas produzidas exclusivamente por plantas da espécie cannabis. Os seres humanos produzem naturalmente substâncias semelhantes a estas, porém com intensidade e duração de efeito menor. Cada um dos fitocannabinóides tem um efeito medicinal específico e a interação entre diferentes proporções e combinações de 2 ou mais deles resulta em uma resposta singular de cada organismo humano. Como ocorre com qualquer outro medicamento, cada ser humano reage de uma maneira específica. É claro que existem efeitos que são similares da maior parte das pessoas, mas existe uma enorme quantidade de variações também, como ocorre com qualquer substância de uso terapêutico. De todos os fitocannabinóides, apenas o THC apresenta efeito psicoativo. Os outros fitocannabinóides e terpenos apenas interagem com o THC ajudando a modular a experiência psicoativa. Por exemplo, os efeitos ansiolíticos do CBD e CBN ajudam a controlar a ansiedade que algumas pessoas experienciam ao utilizar doses muito elevadas de THC. Abaixo temos alguns dos fitocannabinóides mais conhecidos e seus efeitos farmacológicos.
CBG (Cannabigerol): Não psicoativo. Ação antimicrobiana. Diminui a pressão intraocular (Glaucoma)
CBC (Cannabichromeno): Não psicoativo. Efeito sedativo (modera o efeito do THC). Analgésico. Promove o sono.
THCV (Tetrahidrocannabivarin): Psicoativo. Torna o efeito psicoativo mais intenso e faz com que chegue mais rápido, podendo causar euforia). Analgésico. Suprime a fome.
THC (tetrahidrocannabinol): Psicoativo. Analgésico. Estimula o apetite. Bronco Dilatador. Abaia a pressão intraocular (Glaucoma). Diminui o enjoos e náuseas.
CBD (Cannabidiol): Não psicoativo. Relaxante muscular. Reduz espasmos musculares (epilepsia). Analgésico. Efeito sedativo (modera o efeito do THC). Promove o sono.
CBN (Cannabinol): Não psicoativo. Analgésico. Efeito sedativo (modera o efeito do THC). Promove o sono.
Terpenos – A aromaterapia da cannabis
Grande parte da resina da cannabis é formada por terpenos, substâncias que dão o aroma e sabor característico de cada uma das plantas. Existem terpenos em diversas outras plantas, especialmente em flores e frutas. A composição de diferentes terpenos com variadas proporções define a singularidade dos cheiros e gostos de cada vegetal. Os terpenos têm também, por si só, suas propriedades medicinais específicas Na aromaterapia, os óleos essenciais, feitos a partir da resina de plantas aromáticas, são utilizados para acabar com a ansiedade, aliviar o stress, promover foco e concentração, dentre diversos outros usos. Quando os terapeutas vaporizam ou queimam essas essências estão, na verdade, administrando doses de terpenos. Os tipos e quantidades de terpenos presentes na cannabis interferem na forma como os fitocannabinóides são absorvidos e processados pelo organismo.
Os terpenos podem atuar modulando os efeitos da cannabis no corpo humano de diferentes maneiras. Eles modificam a forma como o cérebro recebem os fitocannabinóides, tornando a absorção mais rápida ou mais lenta, e também prolongando ou encurtando a duração desses efeitos. Além disso, Dopamina e Serotonina, dois dos principais reguladores naturais do humor, produzidos pelo corpo humano, que também são responsáveis por diversas outras funções vitais, têm seus efeitos afetados pelos terpenos. Vale lembrar que os terpenos não estão apenas na cannabis, mas sim em todas as plantas aromáticas. Ou seja, os cheiros realmente mexem com os seres humanos de forma profunda e intensa, muito mais do que nos damos conta. Na maconha, essas influências são ainda mais intensas, pois estamos consumidos doses bem concentradas não apenas de fitocannabinóides psicoativos, mas de terpenos, e a cannabis é uma das plantas com maior concentração de terpenos também.
Métodos de preparo e consumo
Os diferentes métodos de preparo e consumo também interferem nos efeitos da cannabis no organismo. Isso porque, variando o tipo de método de produção do medicamento ou de consumo, varia também a disponibilidade dos fitocannabinóides para o organismo e a maneira como este processará as moléculas para obter os efeitos desejados. Por exemplo, em caso de pacientes que se medicam vaporizando, precisam estar atentos que cada fitocannabinóide fica disponível em diferentes temperaturas. Enquanto THC precisa de algo em torno de 150 graus Celsius, CBD exige um pouco mais, por exemplo. É preciso ficar atento também para os diferentes métodos de utilização e suas variações quanto aos efeitos e duração. Enquanto que com a vaporização da cannabis se obtém um efeito quase imediato, mas que dura poucas horas, consumindo os fitocannabinóides de forma oral ou em supositórios (anal ou vaginal), costuma-se obter um efeito que demora muito mais para começar a ocorrer, mas que se prolonga por muitas horas e torna os fitocannabinóides muito mais biodisponíveis no organismo dos pacientes. Alguns métodos de uso tópico, como pomadas e adesivos transdermais também ajudam a tornar os fitocannabinóides disponíveis no organismo com o mínimo de psicoatividade.
THC A para pacientes com intolerância aos efeitos psicoativos do THC
Muitos pacientes relatam que os efeitos psicoativos do THC é algo inconveniente quando estamos falando de medicar pessoas idosas ou crianças, ou mesmo adultos que não estejam habituados ou se identifiquem com os efeitos psicoativos do THC. Seja como for, é importante destacar que na cannabis crua e em sua resina natural existe muito pouco THC. O que existe em abundância é o Ácido-THC, ou THCA, como é mais conhecido, uma molécula orgânica que não tem efeito psicoativo sobre a mente humana, mas que quanto é aquecida a cerca de 100 graus Celsius ou mais, processo conhecido por cientistas como descarboxilação, se converte em THC, essa sim uma substância tão poderosa na função de ativar a mente humana de uma maneira singular que muitos a utilizam somente para esse fim. A maioria dos usuários recreativos não se dá conta, mas faz a descarboxilação na brasa do baseado sem nunca sequer ter pensado sobre o assunto, apenas seguindo a tradição milenar humana de aspirar a fumaça da queima da planta para elevar a mente.
Em muitos estados dos EUA e diferentes países onde há regulamentação dos usos medicinais da cannabis os pacientes fazem suco de flores de cannabis crua ou utilizam extratos com técnicas de extração a frio para concentrar a resina ainda crua e preparar medicamentos ricos em THCA. O THCA tem quase as mesmas funções do THC, com a principal diferença que não tem efeito psicoativo.
Interação medicamentosa
Como qualquer outro medicamento a cannabis pode ter efeitos adversos quando em interação com outras substâncias. Ainda existem muito poucas pesquisas e dados clínicos que revelem um panorama mais claro sobre os efeitos da interação da cannabis com outros medicamentos. Porém, como sabemos que a cannabis pode ter seus efeitos psicoativos ampliados quanto em interação com álcool ou outras drogas, é bom evitar o uso em associação com benzodiazepínicos ou outros medicamentos que atuem nos mesmos receptores do álcool, ou que causem efeitos sobre a psiquê.
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