sexta-feira, 4 de setembro de 2009

4/09 - Sexta-feira - 5ª SESSÃO (I PARTE)

Texto: Sergio Vidal, Luísa Saad, Laura Santos.
Fotos: Bruno Rohde.
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5ª Sessão – Drogas, indivíduo e sociedade (I PARTE)


1 - A Lei 11343/2006 e o usuário de drogas. Emanuela Lins - Advogada.

A advogada Emmanuela Lins fez uma exposição detalhada sobre a Lei 11.343, principalmente nos seus aspectos relacionados com a conduta voltada para o consumo próprio. Emmanuela destacou que, para essa Lei, o usuário é um cidadão de direito que deve ser apoiado, amparado. Segundo ela, já o traficante recebe um tratamento que o destitui do estatuto de cidadão, sendo-lhe reservado o papel de escória.

A advogada chamou a atenção para o fato de que a Lei, norma penal em branco, não estipula quais as drogas que estão sob controle, informando apenas que é a Portaria 344 da Anvisa, atualizada constantemente, que cumpre essa função. Ou seja, bastaria que a Anvisa retirasse uma substância da Lista para que essa deixasse de ser criminalizada.



Emanuela Lins - O usuário de drogas sob a luz da Lei 11343

Emmanuela ressaltou que as formas de caracterização do consumo pessoal – quantidade x natureza da substância, local e situação da apreensão e circunstâncias sociais e pessoais – faz da Lei uma criação direcionada para as classes média e alta, na medida que as pessoas de classe baixa apreendidas tenderiam sempre a serem acusadas de traficantes. Nesses casos, ela frisou a importância de uma análise conjunta de todos os critérios e uma maior sensibilidade e conhecimento sobre as diferentes substâncias, por parte dos magistrados.

A advogada chamou atenção para o fato de que a lei ainda dá muitas margens para arbitrariedades, destacando que, em muitos casos, os magistrados conhecem a lei mas não conhecem as diferentes realidades dos usuários, fazendo com que esses muitas vezes sejam julgados como traficantes. Lembrou sobre o risco do consumo em grupo, que passa a ser considerado como estímulo, indução ou oferta, gerando um incentivo a consumos egoísticos e a falta do conhecimento das autoridades sobre as variadas culturas no país, especialmente as que fazem uso religioso das plantas e, na teoria, tem seus direitos à prática religiosa garantidos, mas não podendo exercê-los na prática.

Emanuela Lins - E quem é o usuário de drogas sob essa nova Lei?

2. O atual perfil dos condenados por tráfico no Rio de Janeiro - Luciana Boiteux, Professora Adjunta de Direito Penal da UFRJ.

Especialista da área de Criminologia, a advogada Luciana Boiteux apresentou dados de sua pesquisa de Doutorado, fundada num estudo sobre o artigo 33 da Lei de Drogas, identificando perfis dos julgados como traficantes.

Luciana abriu sua fala com uma excelente explicação do marco teórico da pesquisa: o “garantismo”, no qual o direito penal tem como função a limitação do poder de punir, assegurando que estará sob controle e em acordo com o Estado Democrático de Direito.

“Não há crime sem lei anterior que o defina”. A partir dessa frase, Luciana apontou que o proibicionismo é apenas uma das formas de controle, a menos humana e a mais repressiva. Segundo ela, a melhor forma seria a partir das Políticas Públicas que fizessem distinções claras entre o uso e o abuso das drogas. Para ela, a proibição é usada pela sociedade para se eximir da responsabilidade por conflitos que não sabe como lidar, jogando para o Direito Penal esses problemas e sentindo-se mais “segura” com essa alienação. Destacou que o proibicionismo, apesar de ter apenas 100 anos, já causou um enorme estrago e que agora é preciso pensar em formas de fazer a transição para modelos de controle mais pragmáticos e humanizados.



Luciana Boiteux - Debatendo corajosamente a necessidade de mudanças nas Políticas e Leis sobre drogas

Segundo Luciana, a nova Lei produziu um efeito de encarceramento em massa e veio como incentivo à repressão policial e execuções em larga escala. A pesquisadora fez uma reflexão importante, chamando atenção de que alguns trechos da lei de drogas contrariam não apenas a Constituição, como também todo o histórico de formação do conceito de direito penal.

A advogada apresentou diversos dados estatísticas da pesquisa realizada no Rio de Janeiro e em Brasília, revelando que a maioria dos acusados de tráfico eram réus primários, em sua grande maioria encontravam-se sozinhos e portando pequenas quantidades das substâncias, e apenas uma pequena quantidade deles portava arma. Fez críticas à formação do Poder Judiciário, excessivamente positivista e conservador.

Apresentando as tendências internacionais, Luciana apontou a falta de consenso na reunião da ONU em Viena, em março de 2009, destacando que uma bancada forte de oposição pressionou por uma mudanças na Política Internacional, e afirmou que há uma forte tendência dos países da Europa, como Portugal e Espanha, para elaborar e colocar em prática Políticas sobre Drogas mais eficientes e pragmáticas. Luciana sugeriu que o Brasil deveria se alinhar às políticas da Europa, aumentando estratégias de redução de danos e prevenção, descriminalizando o uso e a posse e garantindo maiores direitos aos acusados.

Luciana conclui sua apresentação refletindo a respeito dos motivos que levariam a lei a ser aplicada de forma tão diversificada, afirmando que muito disso se deve à formação excessivamente positivista dos operadores do Direito. A advogada fechou sua apresentação afirmando que a atual lei de drogas é inconstitucional, principalmente porque o artigo 33 não diferencia tipos de tráfico, nem é adequada ao fenômeno que pretende regular. Afirmou: “A atitude política deve partir de todos os cidadãos, divulgando os dados da pesquisa, propondo, debatendo.” Para a ela, há uma enorme necessidade de discussão do modelo proibicionista, extremamente ineficiente, desumano e em desacordo com a realidade: “Nem a violência nem a repressão policial inibem o consumo ou a venda de drogas”.



Luciana Boiteux e Emanuela Lins - Debate sobre a Lei 11343

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