quarta-feira, 11 de junho de 2008

Debater sobre a maconha é legal?


Nas últimas semanas muito tem sido discutido sobre o evento denominado ‘Marcha da Maconha’, organizado por centenas de instituições, ONG´s e indivíduos em mais de 200 cidades em todo o mundo. A maioria dessas discussões giraram em torno da polêmica de se o evento pretendia ou não praticar ‘apologia ou incentivo ao uso da maconha’.

O principal argumento dos que têm defendido a criminalização desses movimentos sociais que lutam por mudanças nas leis e políticas sobre drogas é a utilização da acusação de que o título do evento “Marcha da Maconha”, por si, já seria uma expressão apologética que despertaria automaticamente o desejo incontrolável das massas, principalmente menores de idade, em consumir a erva em locais públicos sem qualquer tipo de respeito às leis vigentes ou de receio às punições nelas previstas.

No entanto, tal acusação é no mínimo construída a partir de uma análise superficial da questão, já que não somente ignora os conteúdos e argumentos propostos por esses movimentos no sentido de reivindicar a abertura do diálogo entre o Estado e a Sociedade Civil sobre reformas nessas leis e políticas, mas também o histórico dos trabalhos realizados pelas organizações envolvidas nesse debate, muitas delas com quadros compostos por professores universitários, pesquisadores e especialistas no tema de reconhecimento nacional e internacional.

Mesmo se nos detivermos apenas ao nome do evento “Marcha da Maconha”, veremos que os argumentos que embasam as acusações de apologia não podem ser sustentados diante de uma análise mais profunda e detalhada. Sobre isso, vale a pena lembrar que a Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes, criada em 1936, em parceria com as Comissões dos Estados de Sergipe, Bahia, Alagoas e Pernambuco foi responsável pelo “Convênio Interestadual da Maconha”, realizado em 1946 na cidade de Salvador, para discutir formas de tornar efetiva e colocar em prática a Lei que tornava crime o porte, comércio e plantio de Cannabis, criada em 1932.

O nome desse encontro não era “contra a maconha”, ou “pela repressão da maconha”, e sim “da maconha”, exatamente como o título da Marcha, que foi proibida de ser realizada em quase todas as cidades brasileiras em que estava prevista para acontecer, com o argumento principal de que esse nome não era apropriado. Apesar do título, o tal Convênio não foi proibido de acontecer em 1946, nem houve qualquer tentativa para proibir o evento. Talvez pelo fato de que sua intenção era de aumentar a repressão ao uso da planta, que à época era consumida principalmente por negros, ex-escravos e pela população pobre e marginalizada do Norte e Nordeste do país, grupos que historicamente nunca tiveram acesso ao diálogo com o Poder Público, nem condições sociais ou econômicas de se organizar para pedir reformar nas Leis e Políticas Púbicas sobre drogas.

Hoje, 62 anos depois, a sociedade brasileira sofreu muitas mudanças sociais, culturais, econômicas e políticas. Apesar disso, as populações marginalizadas continuam sem acesso ao diálogo com o Estado e os fatos sobre a criminalização da Marcha da Maconha tornam mais explicito que ainda falta um longo caminho para que a Democracia brasileira possa ser considerada como tal e se distancie dos períodos ditatoriais das décadas de 1930/40 e 1960/70, quando o modelo proibicionista de Leis e Políticas sobre drogas foi criado e implementado.

Nesse sentido, cabe perguntar se fomentar a discussão e o debate sobre reformar nessas leis e políticas são de fato uma conduta de apologia às drogas ou se são apenas uma das muitas maneiras de se ajudar na construção de um país verdadeiramente digno de ser reconhecido como Estado Democrático de Direito. Respeitamos a Democracia brasileira e a capacidade de julgamento não só dos leitores desse blog, mas de todos os cidadãos brasileiros e, por isso, acreditamos que, aos poucos, a verdade sobre os reais motivos da proibição das Marchas venha à tona. Acreditamos que não só é legal e legitimo debate sobre as políticas e leis sobre a maconha, como no atual contexto social e político isso é imprescindível, se quisermos construir um país melhor e mais democrático, que assegure aos seus cidadãos o acesso à saúde, segurança e aos direitos fundamentais.

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