domingo, 21 de outubro de 2007

Capitão Nascimento e a cultura da impunidade

Por Manuela d`Avila
Deputada federal pelo PC do B/RS
Ex-diretora da UNE (gestão 2003/2005).

A controvérsia trazida pelo filme Tropa de Elite nos impõe diversas reflexões sobre segurança pública, tráfico e consumo de drogas. Entretanto é necessário debatermos a construção de uma espécie de "heroísmo" em práticas ali vistas.

Tropa de Elite é um filme e seus atores retratam relatos de policiais do BOPE (Batalhão de Operações Especiais da PM/RJ) sobre a relação da sociedade com a polícia. Não é correto punir o filme pelo tema ou sua equipe pela abordagem. Fosse assim, não existiriam filmes sobre o nazismo e a propaganda de Goebbels. O problema não reside portanto no filme, mas na interpretação que é feita a partir de angústias reais da sociedade. O personagem central do filme, capitão Nascimento, tornou-se figura símbolo de um ideário no qual valores como a honestidade e o combate à corrupção são centrais.
Este mesmo personagem tortura e mata, mas mesmo assim é visto com alguma simpatia por parcelas da população. Por que?

O que está por trás do fascínio pelas ações violentas do personagem é a crescente sensação de impunidade que vivemos em nosso país. Não se pode negar que existe um forte corte de classe nas punições, políticos e empresários quase nunca são presos ou punidos. A corrupção é a face mais visível da impunidade, mas ela está presente em todas as esferas da sociedade. O banqueiro Cacciola lesa os cofres públicos, foge para a Europa, e em 2005 a doméstica Angélica Aparecida foi condenada e presa por roubar um pote de manteiga.

A impunidade justifica o endeusamento da violência e da tortura, pois em Tropa de Elite o antônimo do corrupto é o torturador.

É preciso se questionar se este é o sistema que queremos?

Interessante analisarmos que o Estado brasileiro tortura sistematicamente e cotidianamente os seus presos. Como afirmou o diretor do filme, José Padilha em entrevista recente, colocar 30 presos numa cela onde só cabem 5 é uma forma de torturar este presos.

É preciso enfrentar os desvios legais que amparam a impunidade, criando e aperfeiçoando mecanismos que garantam o amplo direito de defesa e também a punição devida. daregia
Como destaca a juíza Cleuza Mariza Silveira de Azevedo, titular da Vara de Execuções das Penas e Medidas Alternativas do Foro Central de Porto Alegre, "É importante que os lidadores da execução penal falem sobre o que dá certo ou não e que sejam ouvidos pelo legislador para que, em um trabalho conjunto, possam chegar a um resultado efetivo na execução das penas, sem enaltecimento da impunidade".

O combate à impunidade este é o cerne do debate suscitado pelo filme, e este é o nosso verdadeiro desafio.

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